sábado, 12 de setembro de 2015

Quilombo e os conflitos atuais



  Após 1888 o relativo isolamento das comunidades negras garantiu a permanência da paz. Com o avanço das grandes propriedades de terras foi comum à grilagem de terras e muitas comunidades quilombolas foram invadidas forçando os habitantes a abandonar seu território ou trabalhar para os opressores se metamorfoseando de posseiros em agregados dos latifúndios (ARRUTI, 2005).
  Ou seja, a mesma estrutura latifundiária que raptou seres humanos do continente africano para o trabalho escravo, retirou e quer retirar várias comunidades quilombolas dos seus territórios ocupados secularmente (O ́DWYER, 2002).
  Estas espoliações acontecem até os dias de hoje, mas, com o avanço dos movimentos negros e a Constituição, a correlação de força entre as comunidades quilombolas e os fazendeiros sofreu alterações.
Houve uma mudança de grupos marginalizados, para grupos com direitos “amparados” pelo Estado, trazendo para as comunidades uma nova força para enfrentamentose conquistas (ARRUTI, 2005).
  Esse arcabouço constitucional que dá direitos as comunidades quilombolas faz parte também dos direitos fundamentais do Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1976. Esse tratado, patrocinado pela ONU, foi aderido pelo Brasil, sendo incorporando em sua ordem jurídica (Fiabani, 2005).
 A resposta dos movimentos sociais a estas conquistas se deu com a criação de várias organizações negras e quilombolas. Entre estas ressalto a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais (CONAQ), criada em 1996, na cidade de Bom Jesus da Lapa. Essa organização surge em uma reunião de avaliação do I Encontro Nacional de Quilombolas realizado em 1995, conquistando assento na Comissão Nacional de Comunidades Tradicionais (ALMEIDA, 2008).
  Além da organização Quilombola, as comunidades procuram parcerias para enfrentar edivulgar seus conflitos, articulando interesses com entidades como
universidades, promotoria pública, igrejas, outras comunidades tradicionais e grupos políticos que atuam
na aprovação de leis favoráveis as comunidades.

Entendendo melhor


  Podemos afirmar que as comunidades quilombolas compartilham de um mesmo sentimento de identidade comunitária de ação coletiva, pois a formação de quilombos, seja nas fugas antes de 1888, ou em negociação com os fazendeiros, são modos de se conquistar a liberdade em grupo. A identidade coletiva é bem presente nestas comunidades por parentescos, afinidades e histórias em comum, quando enfrentam um conflito coletivo tende a se fortalecer enquanto grupo se organizando para responder ao conflito, fortalecendo assim a identidade quilombola da comunidade como meio de garantir seus direitos.
 No caso da Comunidade Quilombola Baú, este fortalecimento da identidade tem se mostrado importantíssimo em suas conquistas, seja no acesso a educação e saúde pública, seja no enfrentamento com a família Murta. Além de organização para o conflito, a identidade também fortalece a cultura da comunidade, com a criação de grupos de dança e de batuque organizados pela Associação.
   Esta realidade enfrentada pela comunidade, de vários conflitos sociais, não é um exceção entre as comunidades quilombolas, mas infelizmente uma realidade comum, tendo vários outros tipos de conflitos com empresas de eucalipto, mineração e o Estado com seus grandes projetos de hidroelétricas e parques de conservação ambiental. Neste diversos conflitos podemos ver a resposta dos oprimidos de várias
maneiras, mas sempre com a organização popular como prática social e no caso das comunidades quilombolas, a alto-afirmação da identidade quilombola para auxiliar a organização e o enfrentamento.

Formação da associação Baú

 
 A certificação de remanescente quilombola foi feita pela Fundação Cultural Palmares em 25 de junho de 2008. Com o apoio da Cáritas Diocesana de Araçuaí e Pastoral do Imigrante e a Indigenista Geralda Chaves Soares assessora da Associação Indígena Pankararu Pataxó (AIPPA) a comunidade teve acesso ao conhecimento do artigo 68 da Constituição e dos procedimentos para ser reconhecida como remanescente
de quilombos(NEIVA, 2012).
 Com esse conhecimento, a comunidade se organizou para conquistar estes direitos, dando origem a Associação Quilombola Baú.

Identidade quilombola

  A identidade quilombola pode ter várias origens. Como vimos na discussão sobre quilombos, estas comunidades são originadas da resistência de negros raptados da África. Essa resistência fez com que vários grupos marginalizados se organizassem de várias formas para se reproduzir com certa autonomia. 
  Alguns critérios para o surgimento da identidade quilombola estão bem claros na história destas comunidades, como a raiz comum de vários indivíduos do grupo laços de solidariedade para a manutenção da liberdade, indivíduos marginalizados de vários lugares com um inimigo em comum (ALMEIDA, 2008)

sexta-feira, 11 de setembro de 2015




  A Comunidade Quilombola Baú está localizada no município de Araçuaí, na região nordeste do Estado de Minas Gerais, na microrregião do Médio Jequitinhonha, a uma distância de 678 km da capital Belo Horizonte (NEIVA, 2012). A comunidade está dividida em dois territórios, a área urbana e área rural. O território urbano fica no bairro Sagrado Coração de Jesus, popularmente conhecido como bairro Pipoca (REIS, 2013).

Origem da comunidade



 Embora não se saiba exatamente a origem da Comunidade Quilombola Baú, há fortes indícios que ela seja originária de pessoas que migraram da região da cidade do Serro, no Alto Jequitinhonha, cerca de 360 km da região hoje ocupada pela comunidade.
O que dá forte indício para essa origem são as histórias contadas pelas pessoas da comunidade sobre migração e outra Comunidade Quilombola Baú na cidade do Serro, como a moradora Srª Heroína Pacheco Santos,falaem entrevista dada a Neiva (2012)

"Cresci ouvindo meu pai contar que meus avós saíram às escondidas de um
lugar chamado Serro perto de Diamantina andou noite e dia pelas estradas
sem parar de dia no mato e a noite nas estradas, a fome era tanta que assava
as precatas de coro cru e comia. Passaram por vários lugares até chegar num
lugar chamado Campo, ali eles foram comandados por um coronel. Ali
viveram e vivemos, construímos famílias. Meu pai morreu com o sinal dos
cravos da roseta nas costas, nunca me esqueço. Depois de varias gerações
saímos daquele lugar, pois não podíamos mais plantar nem criar animais.
Sem outra opção tivemos que mudar para a cidade para nossa própria
sobrevivência." (NEIVA, 2012, p. 32)

  A Fazenda Campo pertencia a Maurício Moura Gaspar de Oliveira. Posteriormente, foi dividida em várias fazendas distribuídas entre os filhos da família Murta. De acordo com relatos da comunidade a família Baú
reside na fazenda desde o século XIX.Este dado levanta uma lacuna histórica sobre a chegada da família Murta ao território Quilombola, ou da chegada dos quilombolas nas terras da família Murta e como foi a re-escravidão da comunidade depois de chegada à região de Araçuaí. O certo é que a comunidade foi retirada do seu território secularmente ocupado pelos conflitos com a escravidão, o acesso à saúde e educação pública e os direitos trabalhistas que não eram respeitados pelos fazendeiros (NEIVA, 2012).
  De acordo com Neiva (2012), a família Murta tinha na Comunidade Baú acesso a mão-de-obra muito barata, fornecendo a comunidade porções de terra para que eles pudessem produzir seus alimentos em regime de meeiros (NEIVA, 2012).
 O nome da Comunidade Quilombola Baú traz indícios das raízes étnicas da comunidade. De acordo com a comunidade, o nome Baú vem da sabedoria familiar de produzir baús para armazenar e transportar alimentos e roupas. Registro de Imóveis, Comarca de Araçuaí.
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